30.3.11

metamorfose

Uma mulher na rua. Livros e cadernos na mão
Entra. Talvez em uma escola.
Veste-se. Com roupas feitas de planejamentos, atividades e projetos.
Ouve. O som ensurdecedor do sinal.
Todos logo saem para seus lugares ao encontro dos alunos.
A mulher da rua, agora professora, fica.
Não há um lugar certo. Não há encontro marcado.
Espera. O chamado desesperado de alguém.
Pensa. No que será que me transformarão agora?
Metamorfoseia-se. Em um mesmo dia, várias pessoas.
Não tem mais nome, a chamam pelo nome de outro, do professor-ausente.
Traveste-se. Já não se reconhece uma professora. Talvez secretária, enfermeira, médica, psicóloga, assistente de assuntos aleatórios.
Fim do dia. A mulher-professora, "metamorfose ambulante", vai embora. Cambaleando, confusa, procura nela mesma o que sobrou do que era: uma professora com o simples desejo de ter em seu cotidiano, um encontro marcado com seus alunos.

24.3.11

na geladeira

  Pendurada me encontro, como uma peça de carne na geladeira de um açougue.
  Se olho para trás vejo o que fui, se olho para frente, já não sou.
 De repente, acordo do passado, um passado de fluxo de pensamentos e energia criativa, e me vejo aqui pendurada num lugar gélido e com cores parcas.
  Aqui pendurada, sinto a "gravidade" da situação. Mas que situação, eu me pergunto?
 Uma situação-surpresa, em que uma professora grávida de novas ideias, invenções, com desejo de atuar com a a arte e a vida na escola é pendurada na geladeira-escolar e tolhida de ocupar seu lugar principal, a sala de aula.
  Estar na geladeira é deixar de ser para virar coisa. Coisa que tem nome, "módulo", ou mais conhecido como professor eventual. Des-professorar, tapar buracos, fazer favores, dar aulas em doses homeopáticas, não criar vínculos.
  Virei zumbi, minha alma está vagando, só o corpo está presente. 
  Estou gelada, minhas energias criativas e minha vontade de atuar, pintar e bordar nos planos e nas ações também. Endureci.
 Preciso de fogo. Talvez faíscas. De resistência, de inspiração, faíscas de vida. Faíscas que só são encontradas na relação, no embate entre as gentes (professor+alunos), no cotidiano fora da geladeira e dentro do ambiente mais interessante da escola, a sala de aula.

bio


   Já faz uma ano...um ano que saí da faculdade. Saí de lá não só carregando novas ideias, mas  uma enorme vontade de atuar, propor, arriscar. Hoje sou licenciada em artes. Antes disso já atuava como professora, devido minha formação no magistério.
   Hoje em dia trabalho em duas escolas da prefeitura de São Paulo, uma de educação infantil e outra de ensino fundamental, em ambas sou (ou me tranformaram?) numa coisa chamada "módulo", vulgo professora eventual ou substituta. E é nessa situação, estranha, instável, por vezes, desrespeitosa, por vezes desafiadora que me encontro.